Quando eu era criança ela fez 15 anos. Sua festa foi
registrada num jornal, cujo recorte guardei por muitos anos. Na minha
adolescência ela abriu uma das primeiras butiques do Rio, na Prudente de
Morais. Fui lá conhecê-la. A coincidência de nomes fez com que ela me recebesse
e acolhesse com um humor especial. Constatamos que éramos primas distantes e
ela falou: “Não dá para você mudar seu nome? É um péssimo negócio ser minha
homônima. Sou boêmia, da noite, comerciante endividada... E além de tudo quer
ser jornalista como eu?”
Quando eu era uma jovem que namorava e saía para passear pela
noite carioca com meus amigos, ela abriu uma outra butique, no Leblon, ao lado
do mais badalado restaurante carioca, o Antonio’s. Só que dessa vez resolveu
dar seu próprio nome ao estabelecimento. Grandes confusões! Claro que a família
e os amigos pensaram que eu tinha mudado de ramo e, provavelmente, assaltado um
banco, para inaugurar uma loja naquele local! Foi aí que surgiu a frase que
virou um mantra em minha vida: “Não sou
eu, é a “outra”.
Quando ela casou com Vinicius de Morais, acho que provocou a
maior confusão homonímia (será que essa palavra existe?!) de toda nossa vida!
Até um padre amigo de minha mãe ligou para saber se era eu! Se o casamento
durou pouco, esse fato permanece vivo até hoje. Em tempos de facebook, de vez
em quando, tenho que emitir o mantra para alguns alunos que encontram na rede
informações de meu casamento com o poeta! “Não sou eu, é a outra”, digo para
grande decepção deles que pensavam ter uma celebridade como professora!
Quando entrei no jornal O Globo ela casou com Roberto
Paulino, meu colega e super amigo do Segundo Caderno, com quem aprendi muito do
que sou hoje como jornalista. Jovenzinha recém-casada entrei no jornal um dia e
todos me olharam de um jeito muito estranho. Até que alguém teve a coragem de
perguntar: “O que aconteceu com seu casamento? Você casou com Paulino?” Às
gargalhadas entendi o espanto da turma e respondi com o mantra: “É a outra”.
Quando já estava bem,
profissionalmente, repórter ativa do dia a dia do Segundo Caderno, novamente
fui vítima da perplexidade dos colegas. “Você não estava em Portugal, como
correspondente? Como está aqui agora?” “Não pessoal, não tenho o dom da
ubiquidade! É a outra”.
Quando fui para o Caderno B do Jornal do Brasil assinar
matérias pela primeira vez na minha vida profissional, usei o sobrenome do meu
marido para me diferenciar profissionalmente da prima que era muito mais
conhecida do que eu. Passei seis meses lá num profundo ostracismo até que um
dia, abri o jornal de manhã e vi uma matéria assinada com meu nome de solteira!
Acreditem, ela estava lá, novamente, me envolvendo em equívocos. Daquele dia em
diante meu telefone tocava todas as vezes que era publicada uma reportagem
dela, obrigando-me a proferir o mantra... As minhas, ignoravam.
Quando voltou de Portugal, minha homônima foi morar na Lagoa
com meu colega de redação do Globo. Adivinhem onde? No prédio da minha mãe! Foi
um tal de correspondência sendo entregue errada, porteiros confusos e o mantra
vagando no ar: “não é ela, é a outra”, até que se mudaram.
Quando me mudei para Friburgo com a família, um dia minha
filha caçula entrou em casa e me disse: “Mãe sabe aquela sua prima com o mesmo
nome seu? Ela estava no salão marcando uma hora para fazer as unhas.” Era o
lugar que eu frequentava desde que chegara à cidade e corri para lá para saber
mais informações. Era ela mesma, tinha um sítio perto da cidade e apareceu por
acaso. Infelizmente não voltou na hora marcada e a perdi de vista. Em
Friburgo?????? Demais não acham?
Quando me separei, anos depois, resolvi voltar ao meu nome
de solteira e enfrentar as coincidências dali para a frente. Já estava muito
velha para fugir do destino. Foi um ato de coragem, não só pela presença tão
forte da prima no cenário social, como também por já ter um nome como
jornalista e escritora. A família foi contra, mas insisti.
Quando abri o jornal naquele dia, menos de dois anos depois
de minha separação, levei um choque. Um anúncio de morte com meu nome e
sobrenome saltava aos olhos na página do obituário. Fiquei triste, ela partira
cedo, não tivemos tempo de encarar os resultados dos nomes iguais... Nem
preciso dizer que muita gente achou que era eu e telefonou para minha mãe e
irmãos para ouvir o mantra: “Não é ela, é a outra.”
Quando isso aconteceu voltaram à minha cabeça as memórias de
tantos caminhos cruzados, tantas situações engraçadas, tantas confusões
desfeitas. Confesso que me deu uma certa nostalgia. Será que acabou? Até que um
dia, entro no face da Ana Maria Ramalho e encontro um post a respeito do meu
blog “Universo Paralelo” que dizia mais ou menos assim: “É estranho quando leio
os textos dela. Mesmo nome, jornalista e escreve bem”. Era de Maria de Morais,
filha de minha homônima. A história não acabara. Hoje somos amigas virtuais no
face e esta crônica prometi a ela quando conversamos pela primeira vez. Aliás,
prometi a mim mesma que um dia ia registrar nossa história.
Aí está Cristina Gurjão, para você com carinho de sua prima,
Cristina Gurjão.
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