Quando li “1984”
de George Orwell, há anos atrás, o que mais me fez refletir foi sobre
como aquelas câmeras de controle foram parar em todos aqueles lugares para que
o “Grande Irmão” pudesse fiscalizar o mundo.
Para quem (ainda)
não leu o livro – um clássico publicado em 1949 – é preciso esclarecer que a
obra de ficção descrevia uma sociedade totalitária controlada por um só
governante, o “Grande Irmão”, que controlava a vida de toda a humanidade,
através de câmeras e telas (de televisão?) instaladas em todos os cantos, das
repartições governamentais, passando por ruas, avenidas e estradas, até às residências particulares. A obediência às
regras institucionais era obrigatória e fugir delas implicava em punições
altamente sofisticadas elaboradas a partir de um método psicológico baseado no
medo máximo de cada um. Orwell falava de guerras sem fim entre os continentes que
se revezavam a partir de interesses comerciais e políticos. As mudanças constantes destas
contendam eram anunciadas, incessantemente, para todos os habitantes, através
do sofisticado sistema de comunicação.
Sem entrar
nos detalhes da capacidade de Orwell de se adiantar ao futuro e prever uma
sociedade bem próxima à nossa, há mais de sessenta anos, inclusive a intuição
de um mundo globalizado, dividido entre três grandes potências e interligado
por uma rede que ele sequer podia imaginar existir, vou me deter
ao que me referi no início – a instalação das câmeras.
Minha
pergunta começou a ser respondida no dia em que instalei a primeira webcam em
meu computador. Parei e pensei: “Êpa, estou facilitando a rede do “Grande Irmão!”
Sem paranoias, comecei a usá-la para falar com algumas pessoas, mostrar meus
netinhos aos parentes ausentes, como um ser humano normal do século XXI. No
entanto, nunca mais parei de pensar que estava vivendo o período de implantação
das câmeras que Orwell retratava em "1984".
De vinte
anos para cá, todos nós, da sociedade “pós-moderna” estamos implantando a rede
do “Grande Irmão”. Em nome da segurança, comunicação, exibição pessoal e
controle instalamos câmeras em todos os lugares. Praças pública, prédios de
apartamentos, ruas, avenidas, estradas, escolas, universidade, e o que mais pudermos
imaginar, estão expostos a equipamentos de gravação à disposição dos cidadãos,
das instituições, do governo e da justiça. Pensem em privacidade, agora, e
respondam se conseguem imaginar onde ainda a encontramos. Corram, é lá
que nos escodemos, é para lá que devemos ir. Isto se ainda der tempo...
No dia 10 de
novembro, o jornal O Globo publicou matéria com o título “Sorria, você está
sendo filmado” em que diz que no Rio há uma média de uma câmera a cada nove
habitantes. A cidade conta com 700 mil câmeras de segurança. O mercado de
segurança cresce 10% ao ano e está em franca ascensão. A reportagem discute a
necessidade de um marco regulatório e os limites entre segurança e privacidade.
Ao ler o texto com muitos exemplos e situações polêmicas sobre a instalação de
câmeras é que me veio o sentimento de consentimento para o poder do “Grande
Irmão”. Não sei se as profecias de Orwell se concretizarão em sua amplitude,
mas tenho certeza que é tempo dos indivíduos começarem a se questionar sobre o quanto
estão colaborando para isso. Confesso que há um limiar de permissividade e de impossibilidade
de retorno do desligamento desta perversa rede que me assusta!
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