sexta-feira, 28 de junho de 2013

Meu cartaz

 
 
Há anos atrás, reunida numa sala da ESDI – Escola Superior de Desenho Industrial – com vários estudantes, pilô na mão e cartolina na outra, ameaçava escrever o que mandavam meus sentimentos de revolta e rebeldia, quando fui surpreendida por uma “palavra de ordem”: “Atenção pessoal, eles mandaram escrever estas frases....” Imediatamente reagi: “Eles quem?”
A resposta veio rápida e pronta, típica dos que não sabem pensar por si próprios: “Eles, o comando central, ora!” Naquele momento encerrou-se minha carreira de revolucionária. Larguei o material no chão, levantei e disse: “Só escrevo o que penso, ninguém pensa por mim”. Fui. Depois disso, fiz minha política à parte de comandos e partidos. Sempre fui engajada e simpatizei de cara com o PSDB, aderindo a seus princípios e ideais, mais próximos à minha condição de burguesa com tintas de justiça social. O PT nunca me disse nada, não me enquadrava em seus gritos trabalhistas. Enquanto ele ganhava força, crescia minha carreira de empresária onde exerci justiça junto a meus funcionários e desfrutei dos lucros sem culpa.
Hoje, digo a meus alunos na universidade que na minha época quem fez a mudança foi o PSDB e não o PT. Nos primórdios da distensão da ditadura militar, politicamente correto era seguir os passos de grandes homens, fundadores do PSDB, como Severo Gomes, Franco Montoro, Afonso Arinos de Mello Franco, Ruth e Fernando Cardoso, Mário Covas, José Serra, Heloneida Studart e meu querido e saudoso Arthur da Távola, entre muitos outros que trouxeram o Brasil de volta à democracia. A eles acrescento também nomes importantes que admirei politicamente, naquela época: Tancredo Neves, Ulisses Guimarães e Teotônio Vilela.
E por aí fui “caminhando e cantando e seguindo a canção”, pois concordava que “esperar não é saber (...) quem sabe faz a hora não espera acontecer”. E em minha vida a política sempre esteve engajada nos meus atos e no meu espírito. Meus alunos que só sabem da ditadura militar pelos livros e pelo que lhes contam os mais velhos, ouvem de mim um relato realista e vivido, de um período em que os estudantes de Comunicação da UFRJ tinham aula ao lado de um quartel da polícia e ouviam de dentro das salas de aula, através dos muros que nos separavam, os gritos dos torturados. Ficam sabendo que não tínhamos máquinas de escrever, nem fotográficas e nenhum laboratório, com o objetivo de esvaziar a nossa prática e alienar nossos pensamentos. E que na cadeira ao lado podia estar um espião (haviam vários). Mas de nada adiantou, as redações dos jornais se abriram para os estagiários e lá aprendemos a fazer jornal e política, mesmo que nas entrelinhas... Que turma maravilhosa de “professores” tivemos. Posso citar dezenas que me ensinaram os caminhos do lead e da conscientização social e política. Alguns ainda estão aí, muitos já se foram. Todos são responsáveis pela reconstrução da democracia em nosso país. A eles rendo minhas homenagens.
Hoje, vivemos o maior período de liberdade política em nosso país, desde o descobrimento. Mas estamos apenas engatinhando neste processo, o que são 25 anos, diante de 500? E isso também lembro aos alunos, reforçando que a democracia é uma criação do intelecto humano. Nossos ancestrais Neandertais não eram democráticos, muito pelo contrário, matavam quem se aproximasse das fêmeas, crias, comida e territórios. E por isso todo dia ao acordarmos precisamos nos perguntar: “O que farei hoje pela manutenção da democracia?”
E, agora, com que felicidade vejo a resposta a este apelo que faço aos alunos, nas manifestações de rua pelo Brasil afora. O grito da democracia ecoou forte, quase que querendo continuar a obra de Montesquieu, acrescentando mais um poder ao legislativo, executivo e judiciário – o popular –, já que os três por ele sugeridos já não estão mais nos representando. E a jovem estudante que foi embora das preparações para a passeata, em 1968, se rejubilou com a individualidade e criatividade dos cartazes, expostos nas manifestações em tantas capitais e cidades de nosso país. Eles, certamente, foram escritos sem que “eles” mandassem. Valeu a pena viver para ver este momento e, finalmente, escrever também no meu cartaz: VIVA A DEMOCRACIA!
 
 
  

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